Friday, February 29, 2008

Thee Butchers Orchestra

Teve uma época que eu gostava de ir atrás dos shows do Thee Butchers Orchestra. Sempre que eles tocavam, eu aparecia para conferir. Entreatanto, era com grande freqüência que o show melava. Juro, dava vontade de malhar os caras na pedrada. Era impressionante. Ou o baterista quebrava o pé, ou um dos integrantes dava um chilique cinco minutos antes de subir no palco, ou o outro tinha que acordar cedo e não queria que a banda tocasse por último. Eu até entendo, fazer parte de uma banda deve ser um pé no saco às vezes, maior engolição de sapo, ainda mais de uma banda que está junta há muito tempo no cenário underground paulista, no entanto, eu só queria ver os caras em ação, o que não era pouca coisa. Os dois guitarristas, Adriano Costa e Marco Butcher, eram um arregaço trabalhando juntos como dois operários com britadeiras, formando uma parede de som que te acertava como um paralelepípedo na orelha. Som de filho de puta mesmo. Sujo e áspero como as ruas do centro. Rápido e barulhento como um Mustang Mach 1 circulando por lá de madrugada. Às vezes punk, noutras blues, sempre rock. Esses dias encomendei o vinil “Stop Talking About Music”, daí coloco bem alto no meu 3 em 1, calço minha botas de bico fino, de cuecas, pego a peixera e fico pensando em um monte de parada errada.

esse disco também é foda:



01. 2003
02. I don´t mean maybe
03. blue moon
04. back tabber
05. what about now
06. bunch of losers
07. my dirty fingers
08. backout
09. johnny thunders
10. hot meal
11. smart went crazy

download
Depois do papelão na semifinal da Taça Guanabara, quando perdeu para o Botafogo por 2 a 0, agora o Fluminense ficou sem Leandro Amaral. O atacante rodou, perdeu na justiça o direito de jogar pelo Fluminense e deve voltar às garras vascaínas de Eurico Miranda, correndo sério risco de ser torturado nos calabouços de São Januário. Fora isso, Dodô também pode desfalcar o Tricolor carioca, já que será julgado em abril no caso de doping que ocorreu no ano passado. Desse jeito, acho difícil o time conseguir justificar toda a grana gasta com reforços nesta temporada. Quarta-feira o time entra novamente em campo pela Libertadores.

Apesar disso, sinto que o campeonato carioca 2008 está sendo bem disputado, com clássicos arranca-toco bem movimentados - como foi a final entre Botafogo e Flamengo, fazia tempo que eu não assistia a um jogo tão bom. Isso graças ao Premiere da Net - que eu assinei para acompanhar o Flu -, já que o jogo não foi transmitido por nenhum canal mais acessível, a preferência é pelo insosso Campeonato Paulista, quando praticamente todos os canais transmitem alguma pelada corintiana. Voltando ao carioca, carrego grande vilipêndio pelo Flamengo. Torci muito contra os urubus, mas o pobre Botafogo deu mole outra vez e caiu em lágrimas diante do Maracanã lotado. Na quarta, pela Libertadores, Souza, desajeitado atacante flamenguista, pipoqueiro nato e exímio chupador, após anotar um gol contra o Cienciano, comemorou tirando sarro dos botafoguenses. Pelo visto, o segundo turno, ou a tal Copa Rio, promete pegar fogo nos clássicos. O pau vai comer solto e eu pretendo encarar a Dutra pelo menos uma vez para conferir alguma partida no Maracanã.

Thursday, February 28, 2008

Bo Diddley - Jungle Music





01 The Story Of Bo Diddley

02 Down Home Special

03 Little Girl

04 Bo Diddley

05 You Don't Love Me

06 Diddy Wah Diddy

07 Pretty Thing

08 Bring It To Jerome

09 Dancing Girl

10 Who Do You Love

11 Crackin' Up

12 I Am Looking For A Woman

13 Cops And Robbers

14 Nursery Rhyme

15 Hey ! Bo Diddley

16 You Can't Judge A Book By The Cover

17 Before You Accuse Me

18 Say Man

download (rapidshare)

aos ossos que tanto doem no inverno

Nelsinho, Marião e Sérgio Mello numa tacada só.


"Dois sujeitos que trazem atrás de si um rastro de erros e fracassos redescobrem um sentido para suas vida numa história sobre a amizade e o perdão."

Amanhã é a estréia.

Teatro Ruth Escobar / Sl. Mirian Muniz. (60min).
Sex e sab, 21h; dom, 20h.
R$20. 16 anos.
Estréia 29/02.

Tuesday, February 26, 2008

Ramblin' Man

Bob Dylan está organizando um projeto interessante. Ele vai juntar diversos músicos – Jack White, Liam Nelson, Norah Jones, entre outros - para gravar um álbum com canções inéditas de Hank Williams, o amargurado cantor americano de country dos anos 40/50, que morreu de forma misteriosa no banco de trás de um Cadillac, em 1953. Junto ao corpo gelado do marmanjo, encontraram uma maleta com diversos manuscritos, como a sinistra última canção escrita por ele “And Then Came the Faithful Day”. Hank foi um cantor único, além do country autêntico, criou o estilo honk tonk e fazia um bluegrass desgraçado. Viveu de maneira atabalhoada, aquele tipo de sujeito que nunca pega o caminho fácil da vida. Sofria de fortes dores na coluna devido a uma queda de cavalo na adolescência e bebia até transbordar a cara, fosse no palco, em bares ou em seu programa no rádio. Gostava também de aplicar morfina e vitamina B12 em seus braços finos. Nem mesmo os integrantes de sua banda o aturavam. Suas músicas falavam de tipos imprestáveis, pessoas chorando na chuva, amores perdidos e noites solitárias em bares empoeirados com uma lágrima caindo no copo de cerveja. Tudo de maneira comovente e bondosa, como o sussurro do vento no campo. Com melodia doce e simples e uma poética sofisticada, um trabalho único na forma como usava as sílabas num desafino agradável, Hank foi uma das personalidades mais influentes do country americano.

No livro “Crônicas”, Dylan conta uma história em que ele, ainda bem jovem, visitava Woody Guthrie num hospital distante e fazia companhia para seu maior ídolo, tocando algumas canções no quarto de um lúgubre asilo. Numa dessas, Guthrie declarou que possuía no porão de sua casa algumas caixas de papelão com muitas canções e poemas jamais vistos, só era preciso ir até lá e pedir a sua esposa. No dia seguinte, Dylan deu um jeito de pegar um trem e ir até o endereço. Caminhou no frio e no escuro, passando por um brejo com água até os joelhos e encontrando a casa do legendário cantor, encharcado de lama e gelo. Apenas o filho de 10 anos de WG e a faxineira estavam lá e nenhum dos dois sabiam da existência das caixas. Bob deu um tempo e foi embora de mãos vazias. Quarenta anos depois, essas letras caíram nas mãos do Wilco e de um cantor chamado Billy Bragg. Eles colocaram melodias e gravaram as canções no projeto “Mermaid Avenue” (via zShare). Dylan cita também, que provavelmente esses caras sequer eram nascidos quando Woody o contou sobre as caixas.

Pelo jeito dessa vez ele foi mais ligeiro e se garantiu com Hank Williams. Na minha opinião, esse projeto não poderia estar em melhores mãos.

HW já teve suas canções gravadas por outras lendas da música, e atualmente, ainda é muito interpretado por ai, como no disco novo da Cat Power e na versão de “Weary Blues” que Madeleine Peiroux fez. Em 1971, Johnny Cash e Jerry Lee Lewis lançaram em conjunto, porém gravado separadamente, um álbum com canções do caipira.

Aqui um disco do Ramblin' Man.

Hank Williams - Country Legend (rapidshare)

1. Jambalaya
2. Hey good looking
3. Move it on over
4. Take these chains from my heart
5. Why don´t you love me
6. Settin´ the woods on fire
7. Your cheatin heart
8. Howling at the moon
9. You win again
10. My bucket´s got a hole in it
11. Crazy heart
12. I just don´t like this kind of living
13. I won´t be home no more
14. I´ll never get out of this world alive
15. I´m so lonesome I could cry
16. Kaw-liga
17. My son calls another man daddy
18. Dear John
19. Half as much
20. Ramblin Man

Monday, February 25, 2008

Ando com uma estranha que carrega sentimentos em sacolas plásticas de supermercado. Sentimentos tão puros quanto das plantas de borracha ou de peixes de banheira. Requintes antiquados, segundo ela. Eu me sinto um cretino enquanto espero o amanhecer. Você jamais se cansa. Tudo é uma boa idéia quando não há nada a fazer. Os pingos escorrem pela calha furada. Procuro as cascas da minha ira no fundo das gavetas emaranhadas. Continue me dando conselhos errados aqui nas trincheiras do tempo. Que virou na madrugada insone. E chove sem parar agora. Aqui dentro.

Friday, February 22, 2008


Com vocês, os blogues impressionantes dos talentosos artistas Joshua Middleton e Barbara Canepa.

Thursday, February 21, 2008

a rodovia que partiu meu coração em dois

Na minha casa no deserto. Por volta de 1962. Com a lua estilhaçada no céu, como o espelho da fossa no escuro do lado de fora. Você vem me visitar. A única pessoa que me traz flores, empoeiradas como os livros na estante. O cão não te esqueceu e faz festinha, sapateando e mijando no piso. Penso em descarregar minha Magnum nele, no entanto, apenas coloco a água para ferver. Vamos tomar um chá? Conta-me todas as novidades. Somos mais que amigos. Pergunto se ainda continua com aquele gigolô desgraçado. Já era de se esperar. O fogo corre em minhas veias como um baque de álcool de cozinha. O silêncio impera por alguns segundos, sendo possível escutar um alfinete cair no chão. Mudo de assunto. O que será que aconteceu com Valentina, a bêbada? Arrumou um velhote bem de vida em Tabuleiro Alto, agora trabalha no balcão de um armazém. Eu apenas escuto toda essa ladainha que não faz o menor sentindo. Quero saber o porquê de você vir aqui regar minhas plantas com água sanitária. Quero entender o porquê dessa palhaçada toda que o Fido faz quando você chega. Mas na verdade, estou cagando para tudo isso. Por onde você anda eu posso sentir, como o vento que sopra e levanta toda essa areia que entra pela janela. Você cantarola uma canção esquecida e gira o corpo. Lembra quando você bateu com a moto no poste em Tinguá e estourou a testa? Como poderia esquecer, eu digo, você enfaixou minha cabeça com sua saia branca. Aquela vez só foi pior que o dia que estava sem capacete e engoli uma varejeira, você ria e dizia que eu geraria bernes na barriga. E quando eu te vesti de mulher? Isso ai é piada. O cão deita e coloca as duas patas dianteiras sobre o focinho. Sua casa está imunda. Eu sei, é apenas areia. Todo mundo é muito solitário por essas bandas, você diz. Disso eu não sei, apenas tenho certeza que nunca mais dividirei nada com você. E pelo menos aqui fica distante da rodovia, assim meus cães não são atropelados e divididos em dois. Fido caminha rumo ao curral sob a luz prateada da lua. De cabeça baixa. Ele está velho e cansado. Fico impressionado em como ele está parecido com John Henry, aquele caridoso de merda. Cruzo as pernas esticadas batendo com o salto da bota no piso num estampido seco. Coloco as duas mãos atrás da cabeça me espreguiçando. Lembro de um porre que tive com Valentina em 56. Quando rolamos na lama como dois suínos apaixonados.

Wednesday, February 20, 2008

Ontem, no pé-sujo aqui do lado do meu emprego, um velho camarada virou pra mim e disse: “Carlinhos, ainda bem que você voltou ao normal”. Normal como?, perguntei ressabiado. “Assim, podre, esse lixo que você realmente é”, ele respondeu com a boca cheia de amendoins. Dei um sorriso de lado, cocei o queixo e um cachorro apareceu do nada e cheirou a poça de cuspes que eu tinha formado ao lado da cadeira. Entendi o quê ele estava falando. Meus pais sempre diziam isso quando eram chamados no colégio. O motoboy gordo ao meu lado desferiu um tapa na minha nuca. Eu estava tão absorto que sequer reclamei. Eu sou um lixo. De marca maior. Mas não sou um pipoca murcha. Eu sei me dar bem. Sempre serei assim. Nunca levarei uma vida convencional, disso já basta meu emprego, que me garante nessa corrida. Às vezes dou uma relaxada, arrumo uma vulva suculenta que me faz ficar um pouco mais em casa, contudo, subitamente eu volto para as ruas. Eu gosto disso, de pegar o carro, com uma garrafa de vinho barato encaixado no meio das pernas, Sonny Boy Williamson cantando que pode fazer tudo por conta própria no som e eu dirigindo bêbado, sozinho e feliz. Daí paro em algum lugar, ou encontro meus amigos na Roosevelt e a gente fica falando merda até de manhã. É disso que eu gosto. E eu não vou mudar. Eu não quero casar, nem ter filhos. Nem ninguém me dizendo o que devo fazer. Não quero ser chefe de ninguém, muito menos proletariado. Quero apenas ser livre para ficar por ai, viver da forma que me apeteça, conhecer novas mulheres, músicas estranhas, livros eternos, com o cotovelo no balcão, olhando a grama crescer, como Walt Whitman, para depois morrer e virar adubo. Voltei cedo pra casa ontem, pensando em nada. Estacionei o Opala da madrugada todo torto. Estava realmente bem. Sentei na mesa da cozinha e horas depois saiu alguma coisa. Dessas que me fazem encostar na pia fumando um cigarro e refletir.

**

Hoje o Fluminense estréia na Libertadores. Vou assistir de cueca no sofá. Sem corneta. Se meu time fizer um gol, talvez eu dê um assobio pela janela. Vai rolar um eclipse também. Que maravilha. É engraçado, sempre dizem que o próximo eclipse só acontecerá daqui 432435 anos, mas sempre rola um ou outro no ano seguinte. Acho que nunca presenciei um. Vou jogar pedras na Lua.
Formas estranhas apodrecendo nas calçadas, como frutas num fim feira após um dia quente. Roupas falsas de marca. Carros esquecidos na zona azul. Eu não consigo mais esperar. Para me sentir limpo eu preciso me arruinar. Sinto-me noturno. Consigo ficar acordado a noite inteira. Me movendo em câmera lenta num sonho com assassinatos e cadáveres em porta-malas. Penso em jogá-los de uma ponte sobre o Tiête. Noto meu retrato-falado colado nos postes do Bom Retiro e percebo que meu rosto está sulcado pelas rugas. Nas manchetes dos jornais, toda aquela melação e fingimento. Medo e indignação. Uma repórter diz que não passo de um ladrão mentiroso, ela diz a verdade. Nada posso fazer. Por favor, venha me salvar pela manhã. Tenho crianças para cuidar. E ligações a cobrar. Ninguém pode provar nada. Só não precisa ser ignorante. Apenas arrume um bom advogado e me tire daquele DP imundo. E vamos sair por ai, para chutar a poeira e escrever nas paredes frases desconexas com um pedaço de carvão. Subverter os jardins. Fazer tudo sem razão. E ver o mundo por velhas fotografias. Vamos ficar juntos. E sair pela noite. Acordar de manhã e esquecer daquelas frutas podres e garrafas pets boiando no rio. Vamos um pouco mais. Colocaremos fogo na roseira do vizinho. E fugiremos para casa dos meus pais no litoral. Posso dirigir lentamente através das suas alamedas favoritas. Me forçar a dormir melhor. Posso cobrir minhas dívidas com a garota que dançava na sala. E acabar com suas dúvidas. E parar com todas essas substâncias proibidas. Poderíamos ser amigos de novo. Estou triste por tudo que aconteceu. Costumávamos ser grandes parceiros. Agora você pegou o beco sem olhar para trás. Se eu resolver ter outro filho com você. E caminhar pelo parque até aquela escultura de anjos encardidos. Dividir o assento do último ônibus para lugar nenhum. Se eu parar com os rasantes das grandes alturas. E de cuspir sob as mesas de bar. Se eu procurar respostas na igreja. Se eu voltar a estudar. Poderíamos ser amigos de novo.

Tuesday, February 19, 2008




A Conrad anuncia a pré-venda “Tem Alguma Coisa Babando Embaixo da Cama”, novo volume de tirinhas de Calvin & Haroldo. Esse é o terceiro da série que a editora lança, com material lançado em 14 países ao redor do mundo entre 85 até a metade da década de 90, após isso, Bill Watterson, seu criador - exímio desenhista e grande escritor, um sujeito ranzinza avesso a fotos e entrevistas -, abandonou a prancheta e foi morar no meio do mato com a esposa. A edição começa a ser vendida no dia 24 de março, custará R$ 29,90 e, como os outros da coleção, deve despontar na lista dos mais vendidos das grandes livrarias.

Monday, February 18, 2008

Só o tempo me dirá que caminho tomar. Não me tolero ultimamente. Calafrios e suor. A amargura me corta como o som de um violino tocado dentro de uma floresta fechada. Ontem o senhor apareceu em casa. Estava no sofá quando escutei seus passos pesados sobre os paralelepípedos da rua. Chovia bastante no fim da tarde. Ele bateu com os nós dos dedos, duros e vigorosos como carvalho, na porta da frente. Eu já sabia que era ele, mesmo sem ter sido avisado previamente. Abri a porta de madeira maciça e ele entrou sem me olhar, sem dizer uma mísera palavra. Sacudiu o guarda-chuva e o deixou nos fundos. Sentou-se na poltrona no canto direito da sala, juntou as mãos com os dedos entrelaçados na frente da face. Ele olhava através de mim agora. Pediu água e eu servi um copo da torneira, há tempos não abasteço o filtro. Notou que eu estava impaciente e perguntou se eu continuava pescando. Ando sem tempo, respondi. Não consigo me concentrar em nada, continuei, nem na espera de um peixe que morda o anzol, a isca das oportunidades. Como andam as coisas?, ele perguntou, sempre assim, cortando seu silêncio sepulcral com perguntas simples que me faziam querer falar sem parar. Eu não consigo me alinhar a porra nenhuma. Nem dividir meus pensamentos com alguém, a não ser você, no entanto, você só aparece de repente, e quase tenho certeza que sente, lá do outro lado da cidade, que não estou bem. Às vezes saio e encontro essas garotas da cidade, que parecem sempre estar andando por ai. Passamos a noite juntos e depois eu volto pra cá. Sinto-me um pouco culpado por não estar com quem realmente gosto, só que ainda não descobri quem é essa pessoa. Preciso de uma mulher ao meu lado para ser um homem, eu disse, mas na verdade, era pra ser uma pergunta. Então o senhor puxou um livro de sua bolsa de couro gasto e passou a ler, entre um gole e outro da água. Esse desgraçado ai não vai mais falar nada, pensei. Vai fazer como sempre, me ignorar e me esquecer aqui no canto. Rolei a cabeça no encosto do sofá e puxei uma leitura também. Dormi. Quando acordei, ele já não estava lá. Eu me sentia bem melhor. Coloquei minhas botas e fui dar uma volta pelo bairro. A atmosfera estava fresca após a chuva. Não ventava. Pelas janelas das casas, eu podia ver as famílias assistindo seus televisores de tubo. Uma criancinha, apoiada na janela do segundo andar de um sobrado, acenou para mim e sorriu.

Friday, February 15, 2008

strange blues

Hoje é um dia estranho. Bem estranho. Andando debaixo desse sol, encontrei uma guria sentada numa mureta. Ela chorava baixinho enquanto falava no celular. Fiquei com a imagem dela na cabeça. Minha vizinha, uma pessoa que mora sozinha depois que a mãe morreu e nunca foi de falar muito comigo, me ligou agora à tarde. Disse que estava preocupada comigo. Eu disse que não havia motivo para isso. Ela respondeu que achava estranhos eu não dormir mais e andar de um lado para o outro durante a madrugada inteira. Disse também que podia notar o quanto eu era solitário. Tanto quanto ela. Fiquei lisonjeado, uma pessoa nem tão próxima, apesar de apenas uma parede nos separar, tomando conta. Nunca me vi como uma pessoa solitária. Tenho muitos amigos. Mesmo assim, sinto certo magnetismo pelo termo. Hoje, aqui no escritório, a secretária foi mandada embora. Ela estava aqui havia 8 anos. Era a pessoa mais próxima de mim. Sempre me ligava de manhã me acordando pro batente. Patrulheira. Na hora que vi suas lágrimas, tive certeza da demissão. Ela chegou e me deu um abraço apertado, com o rosto encharcado e o nariz chiando, com um cheiro doce de perfume francês e um ar de princesa abandonada pela velha rotina. Disse que gostava muito de mim. Eu não sou um cara durão. Não sabia como agir. Apenas abracei forte também. Ajudei-a a levar suas coisas pro carro. Tentei encontrar palavras de consolo, no entanto, nada me veio. Eu não sei o que está acontecendo comigo. Noto que algumas mudanças estão acontecendo, bem de leve, como a chegada de uma nova estação. Sinto que algo vai acontecer em breve. Não estou com medo nem porra nenhuma. Quero apenas pegar meu carro hoje à noite, escutar um disco bem tranqüilo. Arejar a mente com o vidro aberto. Dar uma volta por ai e encontrar meus amigos. Nem tocar em assuntos assim. Quero apenas me tolerar um pouco. E conseguir dormir antes do amanhecer.

Wednesday, February 13, 2008

Esses dias, conversei por telefone com um amigão meu que não vejo há bem uns 8 anos. Foi engraçado o papo. Parecia que não nos víamos desde o Natal ou alguma data não tão distante. Eu morava em Campinas quando o conheci. A gente era bem moleque e não nos dávamos bem com as mulheres da escola. Eu tinha a cara coberta por espinhas pustulentas e o cabelo era comprido e crespo e sujo como aquelas moitas que nascem em canteiros no meio de grandes avenidas. Ele era magro cadavérico com o cabelo loiro até a cintura, com os dentes bem tortos como se quisessem sair da boca. Tentamos até formar uma banda, mas ele gostava de heavy metal e eu já caia mais pro punk, por isso não deu certo, além disso, nos poucos ensaios que fizemos, ficamos bêbados escutando um antigo vinil da Judy Garland que sua mãe tinha e não desenvolvemos uma cover sequer. Sua mãe, aliás, era uma pessoa muito boa, sempre me abrigava quando as coisas esquentavam pro meu lado com meu pai em casa. Cheguei a passar quase um mês lá. Ela que me colocou o nome de Carlos Carah, um dia na cozinha, dizia que soava muito bem. Uma pena que tenha morrido há quase 2 anos. Ainda posso lembrar claramente do seu rosto. A gente costumava, na madrugada, roubar um velho Del Rey que ela tinha. Era foda, o carro estava caindo aos pedaços e sacudia como se estivesse sendo chacoalhado pela mão pesada de deus. Colocávamos álcool de cozinha mesmo e saíamos nos rolês pelas bocadas do São Fernando, ouvindo The Who. Numa dessas, debaixo duma chuva escrota, quase atropelamos um cavalo, o carro foi rodando, rodando até acertar a guia e quicar para o outro lado da pista. Mijamos na calça de tanto rir. Após 4 anos naquela cidade de merda, mudei-me para São Paulo e meu camarada ficou por lá, se perdeu no crack e foi enviado para um tratamento com índios no Acre. Ficou seis meses no mato, comendo raízes e bebendo água barrenta. Ele me disse que chegaram a enfiar uma mangueira em seu rabo para lavar todos os resquícios da droga. Depois disso, foi morar na Califórnia - aproveitando que sua irmã havia casado com um médico gringo - numa forma de ficar longe das quebradas. Evitei tocar nesse assunto pelo telefone, entretanto pude notar que ele deve estar tranqüilo, tão tranqüilo que pude notar também o receio dele em me reencontrar.
Ontem andei por ai à noite. Seco e duro como casco de cavalo. Falei com os estranhos pelo canto da boca. Assisti as pessoas na calçada indo pelo caminho contrário. Ando armado ultimamente. Armado de uma música na cabeça que me traz lembranças de uma época onde as sacolas de supermercado ainda eram de papel. Algumas músicas eu não posso ouvir mais desde que você foi embora. Que eu me lembre, dormi meia hora. Eu atravessei a noite olhando para meus próprios pés. Trocando meu estado melancólico pelo sossego. Nada como ficar à toa na rua, no comando dos instantes, mesmo sabendo que o dia seguinte será desgastante. Quando o céu começou a tomar cor, saí de cena. Hoje minha cabeça está como TV sem antena.

Tuesday, February 12, 2008

Como num churrasco que não veio ninguém. Como deus me fez errado. Como alguém que atrapalha sua música favorita. Como uma pistola enferrujada. Estou cagando e satisfeito. Como coisas difíceis de encontrar. E mulheres sem dinheiro para pagar o ônibus. Como amigos quando se está sozinho. Como moedas num bolso furado. Estou cagando e satisfeito. Como um livro com as últimas páginas arrancadas. Como belas canções perdidas num incêndio. E nomes próprios com vírgula. Como cães que perderam o rabo numa briga. Estou cagando e satisfeito. Como gostar de coisas que fazem mal. Como olhos pesados numa manhã de ressaca. Como o último trem subterrâneo. Como uma trincheira alagada. Ou um tênis cheio d’água. Estou cagando e satisfeito.

Monday, February 11, 2008

Lord Have Mercy On Me

Passei o domingo no sofá. Entre leituras acidentais e rabiscos no moleskine que ganhei. Assisti praticamente todos os jogos de futebol que passaram na TV. Egito x Camarões, Santos x São Paulo, Fla x Flu – que foi foda, meu clube arreganhou o cu do menguinho com 3 golaços do Thiago Neves, sendo que o terceiro ele enfileirou a zaga, passou pelo meio das canetas de um bobão e guardou. Pensei em dar uma volta no centro e tirar umas fotos para um trabalho atrasado. Num domingo com o céu cheio de nuvens carregadas, a cidade fica interessante, só que o sofá dominou, e depois veio a chuva para dar uma refrescada no concreto. Estou lendo “Crônicas”, do Bob Dylan e anotando todos os nomes que formaram esse cara. Ele joga referências em todas as páginas, tanto de literatura e de música quanto de heróis esquecidos. Dessas, a que mais me impregnou foi Jessie Mae Hemphill. Porra, essa mulher é uma desgraça. Escutando o som, com aquela voz poderosa e sua língua afiada, fico com muitas idéias atravessadas na cabeça.

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Falando no travador, eu já garanti meu ingresso pro show no dia 5 de março. Foi uma facada na cara, mesmo pagando meia. Tô lá.

Thursday, February 07, 2008

como um domingo de carnaval na cidade de São Paulo

Estive sempre andando por ai. Sozinho na maioria dos rolês da minha vida. Como um erro. Como algo que não vale nada. Com um bolso furado e cheio de moedas. Inexorável. Estive me escondendo este tempo todo. Sozinho na maior parte da minha vida. Depois de te conhecer tudo piorou. Passei a viver como um mendingo, um pedinte do amor. Catando lixo em becos úmidos para esquecer do tesouro que um dia tive. Estive andando por ai. Com minhas botas cheias de lodo. Com uma faca atravessada na garganta. Por terrenos baldios. Por lugares ermos e silênciosos como um domingo de carnaval na cidade de São Paulo. Estive andando por ai. Para bem longe de casa. Estive andando por ai. E nunca mais vou voltar.