– Que porra de roupa é essa? – pergunto, injuriado.
– Meu novo estilo, Soares – Iranildo diz isso e levanta o queixo, daí, devagar, cerra os olhos e arqueia as sobrancelhas –, que nem o John Belushi nos irmãos cara-de-pau, tá ligado?
– Lógico. Tá idêntico. O terninho. Chapéu, pá. Inclusive o jeito de andar.
Ele pára . Todo-todo. Sério como uma estátua de folga.
– Tá me tirando, doido?
– Não. Por quê?
– Que idéia torta é essa?
– Torto é o jeito que cê anda.
– Soares, se liga, truta. Lembra daquelas putas que a gente comeu no Treme-treme depois da quermese da Júnia?
– Sei... roubada do caralho. Foi guela.
– Foi mesmo. Peguei uma bicheira na cabeça da piroca. Fui pro hospital e os caras tiveram que arrancar minha fimose na faca, na marra. Chicletinho. Ou, o doutor disse, as verrugas não sumiriam nunca.
– Vixi! – tento me preocupar, sem rir – você devia tá de repouso, né não?
– O caralho! Tô estressado. Sequer posso socar uma. Ficar em casa é a última opção. Se liga, a máquina de lavar roupa da minha goma quebrou – ele dispara a falar, numa levada que me faz esquecer das merdas e me lembra de como é bom encontrar velhos amigos –, minha velha aparece histérica na hora do almoço, começa a reclamar, com um olhar de doida mal comida, que minhas cuecas estão cheias de freadas, que não iria mais lavar aquilo e que eu sou vagabundo preguiçoso e o caralho. Velha folgada, tru, virei bicho!
– é mesmo? Que que cê fez, gordo?
– Ah, meu coroa começou a gargalhar no sofá, me chamou de mela-cueca, cu-froxo e o caralho a quatro – nessa hora seu rosto fica vermelho, algumas veias surgem no pescoço. – Mandei logo ele foder a mãe. Nisso, só senti uma fisgada aqui do lado da orelha – ele abaixa, tira o chapéu e me mostra uma parte raspada da cabeça com um corte cheio de pontos. – O maldito me lascou uma saleirada, Soares.
– Opa! Ah se fodeu – eu preciso me apoiar num poste. – Seu coroa tem a mira sacana. Maldade. Marcou tua jaca, magro.
– Se liga, parceiro! Tá achando o quê?
– Nada. Só que cê tá todo fudido. Todo costurado.
– Maré... liga?
– Sei. Cuidado pro chapéu não atolar.
Caminhamos pela parte escura da Boca do Lixo, puxo o último cigarro e amasso o maço vazio, arremesso a porcaria numa lixeira de plástico entupida pregada num poste. Erro hein. Preciso de mais cigarros, penso. Algumas nuvens carregadas atrás dos prédios do centro. Acendo. Cortinas numa centrífuga. Iranildo não cala a boca. O coitado tá mesmo com os miolos frouxos. Ele não era de falar tanto assim, acho. Sinto-me perdido como um mongolóide pegando ônibus pela primeira vez. Nisso, na Rego Freitas, um cachorro de três patas passa correndo ao meu lado, late rouco pro nada. Caralho, irmão, o que será que vem por ai? Um maluco imundo com pinta de ladrão vem pelo lado contrário e me interpela:
– Dá um cigarro, sangue – ele chega e estende a mão.
– Não tenho - balanço a cabeça, negativamente, e dou de ombros.
– Então, aí, me dá um pega desse teu crivo – ele insiste, numas de me tomar, atravessar.
– Saí fora, mané, tu não tá em condição de exigir porra nenhuma aqui, certo? – falo com calma, tô na minha, no entanto, o filha da puta tenta me acertar uma muqueta que pega de raspão a minha testa. Iranildo, com toda sua habilidade de baleia fora d’água, empurra o desgraçado. Ele cai. Eu me levanto e, como sou covarde, pego uma vassoura velha de esfregar calçada que encontro numa caçamba de entulhos e malho nas costas do folgado. PÁ! Ele rola pro lado e não esboça reação.
Perco o último cigarro.
Wednesday, May 27, 2009
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3 comments:
ô magro, desenha isso.
Vixi!! começei a ler e não consegui mais parar...
adorei seu blog
"Sinto-me perdido como um mongolóide pegando ônibus pela primeira vez."
Hahaa clásico......
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