Saturday, June 20, 2009
Hoje eu não volto pra casa. Há horas espero Iranildo. Estou cansado de lidar com a frigideira da ansiedade. Não consigo manter minhas mãos paradas. A noite está quente e venta um pouco. As moscas zumbem ao redor da lâmpada do poste sobre minha cabeça. Nenhum carro passa. Ninguém caminha a essa hora. A cidade fica bem mais atraente quando o azul da noite escurece e a Lua aparece para depois se esconder, lá longe. Todos esvaziam a cabeça em frente à televisão, ou dormem tesos ao lado de pessoas que não gostam. Ninguém parece se interessar por algo que não seja trabalho. Apenas pecadores perambulam e pescam oportunidades por ai. Cães latem para o caminhão de lixo na avenida e o semáforo daquela esquina pisca ininterruptamente no amarelo. A temperatura está ideal e minha carne gruda ainda mais nos ossos. O vento sacode o teto do posto de gasolina do outro lado da rua. A cidade opaca em preto e branco como a tela de uma câmera de segurança. Talvez Vanessa durma, ou lixe as unhas, mas isso não importa, é tarde, e, talvez, hoje eu não volte pra casa. Minha garota anda nervosa. Acho que não me tornei o que ela sonhava, nem a metade e meia disso ou daquilo. Logo, com sangue escorrendo perna abaixo, ela coloca toda culpa do mundo sobre mim, grita e arremessa objetos. Se arranha toda. Puxa, como gosto dessa belezinha. No entanto, sou um homem que não aprende. Sei apenas que as coisas não andam bem pro nosso lado. Tenho quase certeza até. E lamento, com as palmas das mãos no rosto. A rotina descascou nossa história. Afundamos na sorte. Assim, hoje eu não volto pra casa. Hoje só amanhã. Sinto uma forte azia me corroendo por dentro, como um caldo de câmbio, e estou cansado de esperar Iranildo. Cretino. Esperar cansa. Um louco numa trincheira. Qualquer coisa me cansa, até as coisas que gosto me cansam, se eu tiver que esperar por elas. Até você, minha sereia de privada, que penteia suas madeixas e balança o pé, que espera pacientemente seu pescador para em seguida o mandar ficar quieto em seu coral. Você me esgota. Seco. O vinho acabou. Já não espero mais. Levanto e desço sozinho a Consolação para ver o que encontro nas beiradas do centro e na zona de prostituição da cidade.
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1 comment:
"Qualquer coisa me cansa, até as coisas que gosto me cansam, se eu tiver que esperar por elas"...texto porretíssimo, adror seus escritos. Beijo.
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