Wednesday, February 24, 2016


Wednesday, December 23, 2015

dessa vez eu peço uma trégua. a estrada não me deixa dormir.
o ano foi um trator, um caminhão betoneira. não consigo avaliar nada depois de tanto trabalho loucura e álcool. a frenesi precisa baixar uma hora, seja com álcool, sexo ou um monte de porcaria. a mão pesada da ansiedade me chacoalha como uma garrafa pet cheia de gás. se eu tivesse forças poderia explodir. mas dessa apenas vez peço uma trégua. eu não posso dormir nem parar o formigamento. sleepwalking. a estrada me chama. eu a enxergo quando fecho os olhos e não consigo descansar. dizem que o mundo está acabando. não vejo mal nenhum nisso. quero minha garota no banco do passageiro, a magnolia elétrica, um crivo na canhota. o vento seco do nardeste. o asfalto. eu quero descobrir o tamanho da lua que afunda no céu.

Wednesday, October 01, 2014


assim, esta série não passa de uma desastrosa reunião de momentos solitários e extremamente íntimos e de má sorte expostos sem ressentimentos. enquanto o tráfego começa a mover suas engrenagens. enquanto os coletivos freiam e rangem como lesmas hesitantes na banguela da Cardeal. a vizinha se apronta para chegar à tempo no emprego no hospital. a luz da cozinha muda, as sombras diminuem no assoalho. enquanto tudo nasce eu canto na cozinha com uma caneta cravada num pedaço de papel. minhas costas estão completamente empenadas e na minha frente algo encharcado de tinta está estirado entre meus braços, frascos de aguada, pinceis, garrafas vazias e um cinzeiro transbordando. algo expelido num momento solitário e que está ali para me alertar que outra manhã imunda me aguarda.

Saturday, September 27, 2014


por aí com pinta de fugitivo de hospício. tava apenas pensando no disco novo daquela banda de frisco e nos nomes dos remédios que a gente era apaixonado. juro que não percebi que era mesmo você parada ali na calçada. a cidade toda molhada e brilhando como uma viagem atormentada de ácido. você e os pingos flutuando através da luz elétrica. seu vestido balaçando como uma bandeira branca na borda de uma trincheira. É solitário por esses lados, você me disse. vamos dar uma volta. vamos até aquele bar. onde sempre tem alguém chorando no balcão. aquela paródia de purgatório. onde os cachorros do inferno estraçalham o lixo dos banheiros. eu sei que eu nunca vou conseguir superar a perda da frágil segurança da minha solidão. seus drinques de veneno. seus dentes de leite. seus tênis rabiscados. ri quando você me falou que aquele senhor balança as pernas como uma galinha antes de cagar. caminhamos madrugada adentro num silêncio flamejante. pessoas gritavam das janelas dos edifícios invadidos. foi só quando passamos por baixo do viaduto, sob um intenso brilho vermelho, que eu percebi as lágrimas. um banho de lágrimas encharcando seu rosto com toda a tristeza que existe. as ruas não pareciam nada bem. elas nunca parecem. por isso voltamos sempre para aquele lugar.

Tuesday, March 04, 2014

terminei de ler a biografia do Syd Barrett e, em certo momento da madrugada, eu entrei no UOL e me deparei com uma enxurrada de subcelebridades com dentes de mentex e roupas brilhantes e axilas aparentes e então eu achei melhor colocar as músicas do Madcap e me senti sendo digerido pelo intestino de um cachorro andando perdido em St. Margareth Square e a ideia de ficar em casa sozinho à noite pra sempre nunca me pareceu tão atraente.

Thursday, December 26, 2013

cadeira

deixei spdrama pra trás no começo da madrugada de ontem. a fernão dias escontrava-se movimentada e fluindo como um multiball numa máquina da pinball. caminhonetes e palios surgiam ao redor da minha barca, que tem som estéreo agora, e meus ouvidos estão zunindo como uma pancada num nervo. percebo isso deitado com o peito cheio de catarro na cama do sítio; a janela escancarada por onde entra a luz do sol matutino e as moscas graúdas e ruidosas que brotam no riacho que corre ao lado. estou me procurando nesse primeiro dia de estrada. estava tão ansioso pra isso que hoje acordei aqui na divisa de estado SP/MG e me senti extremamente melancólico. o trajeto de carro ontem foi realmente muito curto. sequer tive certeza que estava mesmo numa BR. tudo ao redor de são paulo ainda parece são paulo. você precisa rodar pelo menos 300km para estar livre da teia da cidade monstra. minha insatisfação com a decadência e o obscurecimento do meu espírito já vinha me atormentando desde a metade do ano. a vontade de cair fora começou a incomodar com uma paranóia. eu vou cair fora, eu pensava todo dia enquanto voltava pra casa transtornado no começo da manhã. Ficar longe durante um breve período para procurar algo que eu nem mesmo sei se ainda existe. esfregar toda sujeira que está incrustada em minha alma. anúncios de outros mundos. Alguns chamam isso de férias. Tá mais pra trégua, distanciamento voluntário. Não sei se preciso enfrentar algo ou me tornar um fugitivo das trevas interiores, à vontade para tomar decisões arriscadas. Quero mais é que tudo se foda lentamente. Tenho apenas a certeza que preciso atravessar estradas secundárias através do nordeste árido brasileiro, onde as árvores são mortas e o asfalto esfarela como uma casca ressequida, até chegar a porra do litoral, onde eu possa me refestelar com muita muita coisa da pesada. Porque a vida deve ser da pesada. a estrada. Um lugar onde eu posso me tornar uma pessoa pior por opção, não por uma necessidade intoxicante. Um lugar sob um céu bravo e o vento que sopra a favor. Onde os caminhões soam como o arroto de deuses. Uma rota com curvas ameaçadoras. Uma música alta nos falantes. Pra depois fugir de novo com meu pé de chumbo no acelerador e um cigarro na canhota. Deixo o mundo me esquecer um pouco. Sei que existe um destino me esperando, mas eu não me importo, pois eu minto, como agora, e eu mudo de planos em qualquer encruzilhada. Quero apenas enfrentar a estrada, o incógnito, a solidão onde começa a vida e onde surge a morte. Eu volto depois. Ou não.

Friday, September 20, 2013

a conta

Um prato cheio de sangue. O mapa de carne crua num planeta de louça branca. Os dentes que dilaceram a fúria de estar com uma garota aprisionada na tela do celular. A valsa solitária do garçom. O tilintar oco submerso de talheres mal afiados. O uivo silencioso do animal morto com uma toalha no colo. Alimento com espinhas que matam o que alimenta.