Friday, November 26, 2010

Friday, November 19, 2010

almofadas não causam estragos. Douglas disse isso e engoliu sua dose sem piscar ou franzir qualquer coisa em sua face meio avermelhada. Talvez fosse a hora de se levantar e voltar para casa e dormir. Ele friccionava o isqueiro que apenas faiscava. Seus olhos vidrados silenciosamente desmoronavam em grandes blocos, embolando algo dentro do peito. A poeira. O fogo. Os travesseiros. Algo falhava. Sua mulher sentada na calçada do outro lado da rua. O maxilar pressionado. Penumbra ao amanhecer. Douglas fechou os olhos. Depois abriu. E fechou de novo. Talvez olhasse para baixo. Desse de ombros para tudo ao redor. Talvez algo lhe prensasse de forma selvagem. Como se o polegar pesado de deus lhe espremesse como um gomo seco de mexerica. Tentou falar sem fazer o menor ruído. Juntou os calcanhares. Sua cabeça estava dentro de uma panela.

Saturday, November 13, 2010

Tuesday, November 09, 2010

c`alma

todas as promessas têm prazo de validade
podem ser recicladas
assim como todos os fantasmas
que oscilam à noite
na madrugada

não durmo nunca
abstenho
flutuo

anestésico para cavalos sob as luzes do tráfego
num final de tarde laranja
desviando de jornais e sacolas plásticas
de supermercados
nas calçadas

nas janelas dos prédios
onde nada reflete
nos azulejos trincados
nas faces de uma moeda enferrujada

um milhão de coisas
pela metade

ou em partes falhas

só vejo você.
***

*repost

"A gente se mete a escrever porque não sabe lutar boxe nem tem colhões para isso, porque tem os dentes tortos e não pode sorrir como gostaria, porque para os impotentes de todo tipo não há outro caminho, porque todos os feios escrevem ou assassinam e a gente não é capaz de matar nem uma mosca, porque escrever dá importância, porque para chamarem alguém de escritor não é preciso escrever bem, mas para chamarem de filho-da-puta não importa se sua mãe é uma santa, porque tem medo de ficar à deriva sem fazer nada, porque não pode beber toda noite, porque ama a Deus mas odeia as sociedades sem fins lucrativos, porque não tem namorada, porque não há emoções mas insultos, porque na sua casa não tem televisão e o rádio quebrou, porque a mulher do vizinho é gostosa, porque tem medo de ficar careca e por isso evita os espelhos. A gente se mete a escrever porque não se atreve a assaltar um supermercado, porque ama a mulher e ela é namorada do garoto esperto da rua, porque não há revistas pornográficas suficientes, porque quer fazer alguma coisa além de cagar e se masturbar, porque não é o garoto esperto da rua nem o garoto forte nem o engraçado, porque é o garoto nada, porque não vale um tostão furado, porque apanha lá fora, porque sua mãe grita o tempo todo, porque não há ilusões nem luz no fim do túnel, porque sua mãe grita o tempo todo, porque sua mente voa baixo e nunca será outro Cioran, porque não tem coragem para saltar, porque não quer a esposa feia que merece, porque tem medo de morrer sem ter comido um belo cuzinho, porque não tem pai, amigos, nem fortuna, porque não tem o jeito de cuspir do Clint Eastwood, porque se paralisa entre uma e outra intenção, porque era uma vez o amor mas eu tive que matá-lo."


Efraim Medina Reyes