Thursday, December 26, 2013

cadeira

deixei spdrama pra trás no começo da madrugada de ontem. a fernão dias escontrava-se movimentada e fluindo como um multiball numa máquina da pinball. caminhonetes e palios surgiam ao redor da minha barca, que tem som estéreo agora, e meus ouvidos estão zunindo como uma pancada num nervo. percebo isso deitado com o peito cheio de catarro na cama do sítio; a janela escancarada por onde entra a luz do sol matutino e as moscas graúdas e ruidosas que brotam no riacho que corre ao lado. estou me procurando nesse primeiro dia de estrada. estava tão ansioso pra isso que hoje acordei aqui na divisa de estado SP/MG e me senti extremamente melancólico. o trajeto de carro ontem foi realmente muito curto. sequer tive certeza que estava mesmo numa BR. tudo ao redor de são paulo ainda parece são paulo. você precisa rodar pelo menos 300km para estar livre da teia da cidade monstra. minha insatisfação com a decadência e o obscurecimento do meu espírito já vinha me atormentando desde a metade do ano. a vontade de cair fora começou a incomodar com uma paranóia. eu vou cair fora, eu pensava todo dia enquanto voltava pra casa transtornado no começo da manhã. Ficar longe durante um breve período para procurar algo que eu nem mesmo sei se ainda existe. esfregar toda sujeira que está incrustada em minha alma. anúncios de outros mundos. Alguns chamam isso de férias. Tá mais pra trégua, distanciamento voluntário. Não sei se preciso enfrentar algo ou me tornar um fugitivo das trevas interiores, à vontade para tomar decisões arriscadas. Quero mais é que tudo se foda lentamente. Tenho apenas a certeza que preciso atravessar estradas secundárias através do nordeste árido brasileiro, onde as árvores são mortas e o asfalto esfarela como uma casca ressequida, até chegar a porra do litoral, onde eu possa me refestelar com muita muita coisa da pesada. Porque a vida deve ser da pesada. a estrada. Um lugar onde eu posso me tornar uma pessoa pior por opção, não por uma necessidade intoxicante. Um lugar sob um céu bravo e o vento que sopra a favor. Onde os caminhões soam como o arroto de deuses. Uma rota com curvas ameaçadoras. Uma música alta nos falantes. Pra depois fugir de novo com meu pé de chumbo no acelerador e um cigarro na canhota. Deixo o mundo me esquecer um pouco. Sei que existe um destino me esperando, mas eu não me importo, pois eu minto, como agora, e eu mudo de planos em qualquer encruzilhada. Quero apenas enfrentar a estrada, o incógnito, a solidão onde começa a vida e onde surge a morte. Eu volto depois. Ou não.