Thursday, August 14, 2008

insônia por opção

Na madrugada insone, ao invés de gastar as horas tateando o reboco das paredes de um labirinto escuro à procura de uma saída, perdido em meus pensamentos esquizofrênicos, com idéias que entram e saem sem a menor coerência, cato uma antiga história de Jerry Spring e seu amigo Pancho para folhear. Os dois atravessam o velho oeste e salvam uma família indígena. Um xerife mesquinho passa várias páginas perseguindo o grupo, mas acaba se fudendo no final. Depois Pancho enche a cara e se mete em encrenca numa estalagem, no entanto, tudo termina bem. Uma história bem simples, do jeito que eu gosto. Desisto da cama e ligo a TV. Nela passa uma luta de boxe entre dois pugilistas latinos peso pena. A luta é frenética. Parecem duas formigas saúvas disputando uma casca de pão. Os caras são rápidos, aquilo me acende ainda mais. Levanto e fico treinando jabs e cruzados e ganchos no meio da sala. Canso. Sou meu pior adversário. No outro canal, um jogo de vôlei entre Brasil e Rússia e, apesar do narrador e do comentarista expressarem efusivamente que a seleção nacional é muito melhor que qualquer outra nas Olimpíadas, o time perde dois sets seguidos. Canso. Mas não tenho sono. Pego a chave do carro e parto num passeio pelo meio da noite. Desço até a Marginal Pinheiros. A chuva fraca estala no pára-brisa. Ninguém nas ruas. O asfalto molhado reflete o brilho elétrico da cidade. Cruzo caminho com uma viatura totalmente apagada. Entro na expressa acelerando forte. O motor ronca alto. Tentaram levar meu carro na semana passada. Não conseguiram, mas arrancaram metade do painel para levar o som. Carro sem som é como mulher menstruada, é bom, mas complicado de aproveitar o passeio. Agora a música sai dos escapamentos, ou da minha mente, onde vasculho em meu jukebox alguma coisa pra espantar os pensamentos. Encontro Patsy Cline nas gavetas abarrotadas da cachola, ela canta “Shoes” pra mim. Entro na saída pra Castelo Branco. Faço a curva sobre o viaduto a toda. O carro parece querer se perder. Entro em Osasco que parece uma cidade fantasma. São 4:03 da madrugada. Estaciono numa avenida chamada Sport Club Corinthians. Acho tudo isso muito estranho, mas não perco meu tempo matutando. Uma motoca passa zunindo do outro lado, o cara que guia está todo encolhido. A chuva continua, de leve. Faz muito frio. Caminho até um butiquim ao lado de uma borracharia. Os azulejos azuis da parede atrás do balcão escorrem gordura. Um bebum dorme encostado numa geladeira. Um senhor de bigode grisalho e óculos de lentes grossas, com uma camisa da cor dos azulejos, parecida com a dos antigos cobradores de ônibus, me serve uma cerveja trincando. Esfrego uma mão na outra a fim de aquecê-las antes de pegar a garrafa. Vou até uma mesa na calçada debaixo de uma marquise. Encho meu copo e faço um brinde a mim mesmo. Uma homenagem ao grande filho da puta que eu sou. Hoje é meu aniversário.

9 comments:

Pedro Pellegrino said...

Parabéns pelo aniversário, e continue nos brindando com esses textos.Abraço.

Anonymous said...

PARABÉNS!

Adriana Godoy said...

Parabéns procê! E o Alicate?
Texto bom, cara, muito bom. Dá vontade de continuar lendo, como se fosse um livro.

Anonymous said...

osasco é uma cidade fantasma. e essa avenida aí de nome ingrato é perto da minha casa. texto foda.

Carlos Carah said...

opa, valeu ai, rapaziada.

o Alicate tá bem. tá cheio de inimigos no bairro, mas tá inteiro.

abraço

cc

Anonymous said...

feliz aniversario..."too many drivers" de BB Broonzy pra vc!

si.

Melina Schleder said...

como assim? foi seu aniversário de verdade? nem fiquei sabendo....
beijo

Anonymous said...

um pouco atrasada...mas espero q vc tenha tido um feliz aniversário, sr. carlos carah. abraços

Anonymous said...

da hora carcs! acho firmeza como voce conta as historias. parabens pelo seu aniverssario mano!!!