Wednesday, April 28, 2010

Big Rock Candy Mountain

Sempre me pergunto para onde vão aqueles andarilhos esfarrapados quando cruzo com algum deles, cambaleante, com grandes olhos que brilham sob os faróis do carro no acostamento de uma rodovia erma à beira de uma cidade que não existe. Completamente isolado da civilização moderna. Talvez para lugar nenhum. Quem sabe um eterno retorno. Ecos de delírios espumantes para as estrelas no manto negro do céu. Eu vejo o vagamundo caminhando para lugares abandonados e baldios dentro do seu peito, como uma criança de três anos esquecida num parque de diversões semi-desativado, e tento imaginar para onde vai aquele homem e no que ele pensa. Expressões silenciosas na pele vincada pelo sol que cobre os ossos protuberantes. Rosto de granito. Cobertores com marcas de cigarros e carrapichos. Panela sem cabo. Caixa de fósforo vazia. Fadiga permanente e saudade perdida. Nada em lugar nenhum. Sentado no chão, perto de uma fogueira, solitário com resto do mundo que gira ao redor. Indo e vindo no balanço de alguma bebida genuína. Às vezes quando me sinto fajuto, completamente do avesso, fumando furiosamente deitado no colchão olhando o ventilador lento no teto, percebo o andarilho. E sinto inveja de sua bravura.

3 comments:

Mário Bortolotto said...

Eu li uma vez um texto num fanzine de Londrina que era sobre um andarilho. Os carros paravam do lado dele e ofereciam carona de vez em quando. Ele só respondia: "Nunca deixo que me levem".

Adriana Godoy said...

muito bom, muito bom...gosto muito dos seus escritos sempre. Bj

Marcita Amores said...

Hoje um andarilho no Anhababau me chamou atenção, levava umas latinhas amassadas numa grande pasta de plastico em formato de malinha, e um cobertor com alguns panos não identificáveis dobradinhos com o maior dos esmeros encaixados numa mochila. Estava sujo, era tudo o que tinha, mas era tanta sua dignedade.. andava altivo e apesar da mugre parecia não ter saído do eixo.
Outra vez cruzei com um desses homens que foi uma das pessoas mais elegantes e estilosos no trajar que já vi, era magro e meio alto, usava umas roupas de quem tem certeza do que veste, sabe o que lhe cai bem, e um lenço no pescoço,tudo em farrapos.
Quando vejo esses homens sempre acho que eles perderam a certeza do amor.