Wednesday, May 27, 2009

(continuação da porcaria abaixo)

Compro outro maço num boteco em frente e penso um monte de coisas erradas, como meu dinheiro acabar em breve, antes da aurora. Minha testa arde. Tem um galo nela. Não foi nada. Tomei um baita susto. Os espectros da madrugada estão cada dia mais exigentes e agressivos, como os cães famintos do canil municipal. Iranildo parece fora de si, desferindo golpes no ar e pulando de um lado pro outro. Gordo maluco. A gente cola na casa do Varejão. Ele abre a porta com um baseado na boca. Sua aparência está péssima, parece que foi atropelado por um caminhão de lixo e suas tatuagens estão tão enrugadas que parecem que foram rasuradas com uma faca. Seu apartamento fede e as paredes estão descascadas e úmidas. Tem uma xavascuda seminua horrorosa chapada deitada no sofá, sua pança pende para fora de uma camiseta amarela do Sex Pistols, a boca aberta.

– E aiiiii, parceiro?! – ele praticamente berra, sempre fazendo pose de moleque malandrão. O problema é que já passou dos 60, a base de muita cachaça, droga e Yakult pela manhã.
– Aqui nada. Preciso de 20 conto de pó.
– Cumequié? Tá pensando que é papai?
– Falaí, Varejeira – Iranildo já vai entrando, sem a menor sutileza –, quem é essa ronquefuça aqui? Tá breaca hein!
– Porra, não! Você ainda anda com o Iranildo?
– Saí fora – eu digo lhe entregando uma nota amarela –, pega logo a bagaça que eu vou embora.
– Rapaz. Eu tô na moral aqui, fazendo um amor gostoso com minha cocotinha e você chega cheio de panca assim. Tá achando o quê, Soares? As ruas mudaram.
– Eu num acho nada, profeta, sequer procuro. E essa mulher ai tá morta. – coloco a mão espalmada na testa da infeliz – Tá até gelada. Falando nisso, tem uma cerveja ai?
– Ele se vira e vai até a cozinha. Iranildo começa a fuçar nas gavetas numa agilidade gatuna. Ele quer roubar. É um safado.
– Olha aqui – Varejão aparece sem perceber nada suspeito –, pega uma cerveja e toma sua droga.
– Opa! Assim que eu gosto, papai.
– Agora, senhores, vazem – ele sempre diz isso no final, entortando a cabeça e levantando os braços, como um rei decadente expulsando seus súditos de um castelo em ruínas.

Descemos pela escada de incêndio. Um puta fedor de bosta humana. Iranildo tenta me segurar pedindo um teco:

– Vai, Soares. Alivia, porra.
– Pérai, caralho – eu nego – maior fedor aqui.
– Porra, Soares – ele fala, ofegante –, tinha um berro lindão na gaveta do Vereja, deu maior vontade de pegar, ó.

A gente desce pra Gruta. Ficamos na sinuca-cerveja-pó-cigarro e papo-furado até perto do amanhecer. O jotalhão do Iranildo não cala a boca. Eu não entendo nada do que ele fala. Física quântica. Astrologia. Teatro. Rambo. Negros nazistas da Liberdade. Ladainha das mais incompreensíveis.

– Vamo encarar um inferninho – as primeiras palavras que solto em horas, parece – agora.
– Tua mulher vai ficar...
– Cala a boca.
– Porra, Soares, você nunca falou assim comigo – a bebida começa a afrouxar seus sentidos.
– Iranildo, cara, tu não calou a boca desde a hora que te encontrei.
– E daí, porra? Tava com saudade de fazer um rolê com a tua companhia, truta. Dá cá um abraço.
– Saí fora o caralho!

Vejo uma cambada de emos descendo a Augusta. Sinto nojo. Mas passa rápido.

4 comments:

ninguem said...

Ou faz um filme. Tá ótimo isso.

Melhor que 150% das produções desse país chupa cu que a gente vive.

emos no poder!!!

Carlos Carah said...

ninguém,

sou um emo decadente.

chuif.

abraço apertado com a cabecinha no ombro.

ninguemo said...

ain!!!

molhou meu casaco estampado de caveirammmm!!!

quero vê você de chapinha!!!

Anonymous said...

Gostei da continuação. Lendo eu lembro do livro "Estação Carandiru" q as descrições são tão detalhadas q dá para sentir o cheiro ou ver como aconteceu tudo.

bjs

Nani