Saturday, August 07, 2010

Tinha uns caras ai que entravam no mato no meio dum puta breu, puxando os cavalos pelas rédeas. Isso há uns 37 anos atrás. Eu nem imagino como eles enxergavam nessa escuridão duzinferno. Lembro que o Salvador, um capataz negro imenso com uma careca reluzente e um sorriso torto porque tinha quebrado o queixo, acertou o rapazinho lá, o tal do filho do prefeito, como era mesmo o nome dele... Walter, é, o Waltinho. Ele, o Salvador, deu com a peixeira no pescoço do infeliz. Ninguém mandou o janota caçoar do crioulo, né? O sangue jorrou todo no assoalho do salão. Nessa hora foi um escarcéu. Todo mundo abriu. Mas num segundo ficou aquele silêncio que sucede esse tipo de infortúnio, e você sabe do que eu tô falando. O Salvador ficou lá, parado que nem estátua. A cabeça brilhando num suadouro desgraçado, o olhar baixo coberto pelas sombras e a mão esquerda segurando o pulso da outra mão que tava com o facão. O filho do prefeito estatelado, o sangue escapando do corpo bem nutrido pelo talho na nuca que nem petróleo numa fenda de terremoto. Foi do cacete. Aí o Salvador pegou o rapaz pelo calcanhar e foi arrastando através da porta. O corpo ainda deu uma estrebuchada, como se o espírito quisesse ficar no balcão. Eu fui atrás, tinha medo não, eu gostava do Salvador. Mais uns cretinos vieram também, que já estavam até sóbrios nessa hora. Vi o Salvador jogar o corpo do rapaz no lombo do cavalo. Daí foi na frente puxando a rédea, entrou no matagal e sumiu. Ainda fiquei um tempo escutando ele farfalhar o mato enquanto se embrenhava cada vez mais pra dentro, só que depois eu acho que era o vento. Tinha uma lua redonda no céu, que nem uma tampa de panela, isso deve ter ajudado ele a enterrar o Waltinho.

1 comment:

ninguem said...

Muito bom esse. Ma muito bom memo.